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20 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal Regional Federal da 3ª Região TRF-3 - RECURSO INOMINADO: RI XXXXX-43.2018.4.03.6100 SP - Inteiro Teor

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

3ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO

Publicação

Julgamento

Relator

JUIZ(A) FEDERAL NILCE CRISTINA PETRIS DE PAIVA
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Inteiro Teor

TERMO Nr: XXXXX/2019

PROCESSO Nr: XXXXX-43.2018.4.03.6100 AUTUADO EM 10/09/2018

ASSUNTO: XXXXX - SAÚDE - SERVIÇOS

CLASSE: 16 - RECURSO INOMINADO

RECTE: ANA CLARA DA CUNHA CARVALHO

ADVOGADO (A)/DEFENSOR (A) PÚBLICO (A): SP295353 - BEATRIZ BATISTA DOS SANTOS

RECDO: UNIÃO FEDERAL (AGU)

ADVOGADO (A): SP999999 - SEM ADVOGADO

DISTRIBUIÇÃO POR PREVENÇÃO EM 03/04/2019 15:03:46

JUIZ (A) FEDERAL: NILCE CRISTINA PETRIS DE PAIVA

I – RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente o pedido de fornecimento gratuito de medicamento RSHO GOLD LABEL 10ml – dar 0,2 ml por via oral 2x ao dia.

É a síntese do necessário.

Decido.

II – VOTO

O direito à saúde figura entre os direito sociais garantido pelo artigo da Carta Magna. O artigo 196 da Constituição Federal estabelece que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”, por seu turno, nos termos do artigo 198, inciso II, da Lei Maior, o atendimento integral é umas das diretrizes a ser seguida no âmbito das ações e serviços públicos de saúde.

Portanto, um dos deveres do Estado é o fornecimento gratuito de medicamentos indispensáveis ao tratamento de saúde dos cidadãos.

Neste desiderato, devem ser observadas as políticas públicas para a saúde, assim como os decorrentes limites orçamentários. O tratamento a ser seguido é aquele disponível nos serviços de saúde.

Por tal razão, o fornecimento de medicamento específico mediante decisão judicial somente é cabível em situações excepcionais, quando os medicamentos fornecidos pelo SUS não forem eficazes para tratamento indispensável para garantir a vida ou dignidade de vida do cidadão.

No julgamento do Resp 1.657,156/RJ, em sede de recurso representativo de controvérsia, no Superior Tribunal de Justiça, foi firmada a seguinte tese:

“A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:

i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;

ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;

iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência.

Modula-se os efeitos do presente repetitivo de forma que os requisitos acima elencados sejam exigidos de forma cumulativa somente quanto aos processos distribuídos a partir da data da publicação do acórdão embargado, ou seja, 4/5/2018.”

No caso dos autos, a parte autora sustenta na inicial que é portadora de epilepsia mioclonica progressiva e já usou vários esquemas terapêuticos que se mostraram ineficazes para o controle das crises convulsivas sendo recomendado por seu médico o uso do medicamente RSHO GOLD LABEL, a base de canabidiol.

Conforme a documentação médica apresentada, a parte autora apresenta crises de epilepsia mioclônicas desde os quatro anos de idade, com quadro epilético refratário e com piora progressiva e, desde então, apresenta transtorno do desenvolvimento psicológico não especificado, degeneração cognitiva e comportamental, movimentos coreateóides, alterações de marcha, alterações de linguagem, baixa interação social, diminuição do contato visual e agressividade. Comprova histórico de três internações hospitalares em razão da epilepsia de difícil controle, já fez uso de vários esquemas terapêuticos, sem resultados consistentes e duradouros, sempre mantendo um número significativo de crises epiléticas, sendo recomendado o uso do medicamento solicitado para melhora das funções cognitivas e redução significativa das cries epiléticas.

Realizada perícia médica judicial, o senhor perito relata que a parte autora é portadora de portadora de epilepsia mioclónica, de etiologia indefinida, apresenta crises epilépticas desde os 4 anos de idade, com crises eram tônico-clônicas generalizadas. Passou a ter várias crises diversas e iniciou a utilizar valproato e carbamazepina. A partir disso passou a apresentar perda de consciência de maneira intermitente. Quadro clínico evoluiu e apresenta de 3 a 4 crises na semana. O senhor perito relata que a autora utilizou os seguintes medicamentos que não foram suficientes para o controle das crises epiléticas: valproato, carbamazepina, depakene, tegretol, fenobarbital, clobazam, keppra e lamotrigina. Também informa que à autora não foi proposta a utilização de dieta cetogênica ou colocação de estimulação de nervo vago.

Embora o senhor perito tenha concluído que não foram esgotas todas as opções terapêuticas para o tratamento da epilepsia, a jurisprudência vem consagrando o direito ao fornecimento do medicamento canabidiol para o tratamento da epilepsia de difícil controle, quando demonstrado o fracasso dos tratamentos medicamentosos disponibilizados pelo SUS, sem exigir que a pessoa seja submetida a outros tratamentos alterativos.

Cito como exemplo, os seguintes julgados em que foi autorizado o fornecimento do canabiol após demonstrara a ineficácia dos medicamentos disponibilizados pelo SUS, sem exigir que a parte fosse previamente submetida à outras terapias, como dieta cetogênica, colocação de estimulação de nervo vago ou intervenções jurídicas:

“216 - RECURSO INOMINADO 15ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO JUIZ (A) FEDERAL RODRIGO OLIVA MONTEIRO e-DJF3 Judicial DATA: 28/10/2019 Decisão: 15/10/2019TERMO Nr: XXXXX/2019 9301326120/2019 PROCESSO Nr: XXXXX-09.2018.4.03.6113 AUTUADO EM 04/05/2018 ASSUNTO: XXXXX - SAÚDE - SERVIÇOS CLASSE: 16 - RECURSO INOMINADO RECTE: ESTADO DE SÃO PAULO E OUTROS ADVOGADO (A)/DEFENSOR (A) PÚBLICO (A): SP999999 - SEM ADVOGADO RECDO: ...

316 - RECURSO INOMINADO 4ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO JUIZ (A) FEDERAL ANGELA CRISTINA MONTEIRO e-DJF3 Judicial DATA: 22/10/2019 Decisão: 11/10/2019TERMO Nr: XXXXX/2019 9301323617/2019 PROCESSO Nr: XXXXX-27.2016.4.03.6301 AUTUADO EM 03/03/2016 ASSUNTO: XXXXX - SAÚDE - SERVIÇOS CLASSE: 16 - RECURSO INOMINADO RECTE: UNIÃO FEDERAL (AGU) E OUTROS ADVOGADO (A)/DEFENSOR (A) PÚBLICO (A): SP999999 - SEM ADVOGADO RECDO: ...

416 - RECURSO INOMINADO 7ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO JUIZ (A) FEDERAL JAIRO DA SILVA PINTO e-DJF3 Judicial DATA: 26/09/2019 Decisão: 17/09/2019TERMO Nr: XXXXX/2019 9301258330/2019 PROCESSO Nr: XXXXX-53.2018.4.03.6302 AUTUADO EM 15/10/2018 ASSUNTO: XXXXX - SAÚDE - SERVIÇOS CLASSE: 16 - RECURSO INOMINADO RECTE: UNIÃO FEDERAL (AGU) E OUTROS ADVOGADO (A)/DEFENSOR (A) PÚBLICO (A): SP999999 - SEM ADVOGADO RECDO: ...

516 - RECURSO INOMINADO 4ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO JUIZ (A) FEDERAL ANGELA CRISTINA MONTEIRO e-DJF3 Judicial DATA: 07/06/2019 Decisão: 23/05/2019TERMO Nr: XXXXX/2019 9301156073/2019 PROCESSO Nr: XXXXX-80.2016.4.03.6321 AUTUADO EM 12/04/2016 ASSUNTO: XXXXX - SAÚDE - SERVIÇOS CLASSE: 16 - RECURSO INOMINADO RECTE: UNIÃO FEDERAL (AGU) E OUTROS ADVOGADO (A)/DEFENSOR (A) PÚBLICO (A): SP999999 - SEM ADVOGADO RECDO: ...

918 - RECURSO INOMINADO AUTOR E RÉU 4ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO JUIZ (A) FEDERAL ANGELA CRISTINA MONTEIRO e-DJF3 Judicial DATA: 08/11/2018 Decisão: 18/10/2018TERMO Nr: XXXXX/2019 9301208280/2018 PROCESSO Nr: XXXXX-51.2016.4.03.6338 AUTUADO EM 18/05/2016 ASSUNTO: XXXXX - SAÚDE - SERVIÇOS CLASSE: 18 - RECURSO INOMINADO AUTOR E RÉU RCTE/RCD: UNIÃO FEDERAL (AGU) E OUTROS ADVOGADO (A)/DEFENSOR (A) PÚBLICO (A): SP999999 - ...”

Assim, entendo ter restado comprovada a necessidade da parte autora de utilização do medicamento pleiteado para o adequado tratamento de sua saúde.

Já o segundo requisito restou igualmente satisfeito. A incapacidade financeira da parte autora também restou configurada diante da renda auferida pelos seus pais, conforme dados do CNIS anexado aos autos, o qual denota a ausência de capacidade financeira de arcar com o alto custo do medicamento.

Por fim, também preenchido o terceiro requisito. Embora o medicamento não tenha registro, a ANVISA autorizou a importação do medicamento pela parte autora.

Também consigno que a Resolução de Diretoria Colegiada – RDC n.º 17, de 06 de maio de 2015, da ANVISA, permite a importação de fármacos que possuam CANABIDIOL em sua formulação, desde que autorizados pela mencionada Agência, e observados os requisitos previstos na mencionada Resolução.

Conforme tese fixada pelo STJ, no julgamento do Resp 1.657,156/RJ, em sede de recurso representativo de controvérsia, a ausência de registro do medicamento na ANVISA não impede por si só o fornecimento do mesmo, pois serão “observados os usos autorizados pela agência”.

Neste sentido:

“ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. CANABIDIOL/HEMP OIL. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. RESTRIÇÕES. INEXISTÊNCIA. IMPRESCINDIBILIDADE DO FÁRMACO. AUSÊNCIA DE REGISTRO NA ANVISA. EXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO EXCEPCIONAL PARA IMPORTAÇÃO . PROVA PERICIAL. AUSÊNCIA. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL.

O disposto no art. , § 3º, da Lei nº 8.437/92 c/c 1º da Lei nº 9.494/97, no sentido da proibição do deferimento de medida liminar que seja satisfativa ou esgote o objeto do processo, no todo ou em parte, não importa na proibição do deferimento de antecipação da tutela em demandas onde postulado o fornecimento de prestações de saúde, consoante precedentes jurisprudenciais. Não constitui, a ausência de registro do Hemp Oil (RSHO - Canabidiol CBD) na Anvisa, impedimento ao respectivo fornecimento, eis que se trata de fármaco com autorização excepcional de importação deferida pela agência em diversas oportunidades, inclusive no caso concreto. Faz jus ao fornecimento do medicamento pelo Poder Público a parte que demonstra a respectiva imprescindibilidade, que consiste na conjugação da necessidade e adequação do fármaco e da ausência de alternativa terapêutica. Afastada a exigência de prévia prova pericial tendo com conta a situação excepcional tratada nos autos.” (TRF-4ª REGIÃO, TERCEIRA TURMA, AG XXXXX20144040000, REL. SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 12/12/2014)

“AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. LEGITIMIDADE DO MPF. INTERESSE DE AGIR. DIREITO À SAÚDE. DIGNIDADE HUMANA. MEDICAMENTOS SEM REGISTRO NA ANVISA.

(...) 6. O fato de o medicamento não possuir registro na ANVISA não constitui por si só óbice ao seu fornecimento, haja vista que este mesmo órgão permite a importação de medicamentos controlados sem registro no país por pessoa física. 7. Especificamente em relação ao princípio ativo Canabidiol, destaco que a ANVISA reclassificou a referida substância extraída da planta Cannabis deixando esta de constar da lista de substâncias proibidas para constar da lista de substâncias controladas, publicando, ainda, em 06/05/2015 a Resolução - RDC n. 17, passando a permitir a importação em caráter de excepcionalidade de produto a base de Canabidiol em associação com outros canabinoides, por pessoa física, para uso próprio, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para tratamento de saúde. 8. Agravo legal desprovido.” (TRF-3ª REGIÃO, TERCEIRA TURMA, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO – 554906, REL. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2015).

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO - CANABIDIOL - NECESSÁRIO AO TRATAMENTO DE SAÚDE . RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA E À SAÚDE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. É certo que a saúde é um direito social (art. 6º) decorrente do direito à vida (art. 5º), disciplinado no artigo 196 e seguintes da Constituição Federal. Com efeito, é insofismável a ilação segundo a qual cabe ao Poder Público obrigatoriamente a garantia da saúde mediante a execução de política de prevenção e assistência à saúde, com a disponibilização dos serviços públicos de atendimento à população, que nos termos constitucionais foram delegados ao Poder Executivo no âmbito da competência para desempenhar os serviços e as ações da saúde. 2. A responsabilidade pelo fornecimento do medicamento de que necessita a autora decorre do direito fundamental dela à vida e a uma existência digna, do que um dos apanágios é a saúde, cuja preservação também é atribuída aos poderes públicos executivos da União, dos Estados e dos Municípios, todos eles solidários nessa obrigação. 3. Como integrante do Sistema Único de Saúde (SUS), a União e os entes que a coadjuvam têm o dever de disponibilizar os recursos necessários para o fornecimento do medicamento para a autora, pois através de prova pericial restou configurada a necessidade dela (portadora de moléstia grave, que não possui disponibilidade financeira para custear o seu tratamento) de ver atendida a sua pretensão posto ser a pretensão legítima e constitucionalmente garantida. 4. No caso específico a autora, após quadro de dengue, apresenta crises epiléticas fármaco-resistentes às drogas epiléticas atualmente disponíveis no país, a indispensabilidade do tratamento solicitado restou suficientemente demonstrada pelos documentos acostados aos autos, especialmente o relatório médico que é expresso em afirmar a imperatividade da prescrição de Canabidiol como alternativa aos tratamentos já dispensados - todos sem sucesso - considerando a severidade e elevada frequência de suas crises epiléticas. 5. E na medida em que demonstrada a excepcionalidade do caso, não há que se opor como óbice a ausência de registro do medicamento junto à ANVISA, cuja burocracia leva muito tempo para a avaliação de medicamentos úteis em nosso país. A propósito, convém aduzir a Resolução nº 2.113/2014 do Conselho Federal de Medicina, que aconselhou uso compassivo do canabidiol, ainda sem registro na Agência Nacional de Vigilância em Saúde (Anvisa), para pacientes com doenças graves e sem alternativa terapêutica satisfatória com produtos registrados no país. 6. Negar ao agravado o medicamento necessário ao tratamento médico pretendido implica desrespeito as normas constitucionais que garantem o direito à saúde e à vida; mais: ofende a moral administrativa (art. 37 da Constituição), pois o dinheiro e a conveniência dos detentores temporários do Poder não sobreleva os direitos fundamentais. Mais ainda: é uma afronta também ao art. 230 da Magna Carta, que impõe ao Estado amparar as pessoas idosas "defendendo sua dignidade e bem-estar". 7. Cabe ao Poder Público, obrigatoriamente, zelar pela saúde de todos, disponibilizando, àqueles que precisarem de prestações atinentes à saúde pública, os meios necessários à sua obtenção. 8. Enfim, calha recordar que ao decidir sobre tratamentos de saúde e fornecimento de remédios o Poder Judiciário não está se investindo da função de co-gestor do Poder Executivo, ao contrário do que o apelante frisa; está tão somente determinando que se cumpra o comando constitucional que assegura o direito maior que é a vida, está assegurando o respeito que cada cidadão merece dos detentores temporários do Poder Público, está fazendo recordar a verdade sublime que o Estado existe para o cidadão, e não o contrário. 9. Na verdade o Judiciário está dando efetividade ao art. , inc. I, d, da Lei nº. 8.080/90 que insere no âmbito da competência do SUS a assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica. 10. Agravo de instrumento a que se nega provimento. “(TRF-3ª REGIÃO, SEXTA TURMA, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO – 558316, REL. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/11/2015).

Diante disso, preenchidos os requisitos, entendo que o medicamento deve ser fornecido à autora, nos termos do pedido inicial, conforme receituário médico apresentado, em obrigação solidária pelos corréus, os quais deverão concertar entre si a melhor forma de cumprimento da referida obrigação, nos termos da legislação vigente.

Conclui-se, assim, que foram atendidos os requisitos do benefício, resultando evidente a plausibilidade do direito invocado na inicial.

Noto, por outro lado, a presença de perigo de dano de difícil reparação, que decorre naturalmente da manutenção da vida digna e da saúde, de forma que estão presentes os elementos pertinentes à antecipação dos efeitos da tutela, tal como prevista pelos artigos 300 do CPC e da Lei nº 10.259-01.

A tutela antecipada deverá ser cumprida no prazo de 30 (dias), sob pena de pagamento de multa diária que fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia de atraso no seu cumprimento.

No que tange à fixação de multa cominatória, o STJ, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, reconheceu a possibilidade de aplicação na hipótese de descumprimento de decisão que determina o fornecimento de medicamentos. Nesse sentido:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC/1973. AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PARA O TRATAMENTO DE MOLÉSTIA. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA (ASTREINTES) COMO MEIO DE COMPELIR O DEVEDOR A ADIMPLIR A OBRIGAÇÃO. FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DO CONTEÚDO NORMATIVO INSERTO NO § 5º DO ART. 461 DO CPC/1973.

DIREITO À SAÚDE E À VIDA. 1. Para os fins de aplicação do art. 543-C do CPC/1973, é mister delimitar o âmbito da tese a ser sufragada neste recurso especial representativo de controvérsia: possibilidade de imposição de multa diária (astreintes) a ente público, para compeli-lo a fornecer medicamento à pessoa desprovida de recursos financeiros.

2. A função das astreintes é justamente no sentido de superar a recalcitrância do devedor em cumprir a obrigação de fazer ou de não fazer que lhe foi imposta, incidindo esse ônus a partir da ciência do obrigado e da sua negativa de adimplir a obrigação voluntariamente.

3. A particularidade de impor obrigação de fazer ou de não fazer à Fazenda Pública não ostenta a propriedade de mitigar, em caso de descumprimento, a sanção de pagar multa diária, conforme prescreve o § 5º do art. 461 do CPC/1973. E, em se tratando do direito à saúde, com maior razão deve ser aplicado, em desfavor do ente público devedor, o preceito cominatório, sob pena de ser subvertida garantia fundamental. Em outras palavras, é o direito-meio que assegura o bem maior: a vida. Precedentes: AgRg no AREsp XXXXX/MS, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 8/4/2014;

REsp XXXXX/RS, Relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ de 23/10/2008; REsp XXXXX/RS, Relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ de 23/10/2008; REsp XXXXX/SC, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 1/9/2008; e AgRg no REsp XXXXX/RS, Relatora Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJ de 11/6/2008.

4. À luz do § 5º do art. 461 do CPC/1973, a recalcitrância do devedor permite ao juiz que, diante do caso concreto, adote qualquer medida que se revele necessária à satisfação do bem da vida almejado pelo jurisdicionado. Trata-se do "poder geral de efetivação", concedido ao juiz para dotar de efetividade as suas decisões. 5. A eventual exorbitância na fixação do valor das astreintes aciona mecanismo de proteção ao devedor: como a cominação de multa para o cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer tão somente constitui método de coerção, obviamente não faz coisa julgada material, e pode, a requerimento da parte ou ex officio pelo magistrado, ser reduzida ou até mesmo suprimida, nesta última hipótese, caso a sua imposição não se mostrar mais necessária.

Precedentes: AgRg no AgRg no AREsp XXXXX/RJ, Relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, DJe 24/8/2015; e AgRg no REsp XXXXX/SP, Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe 12/5/2015.

6. No caso em foco, autora, ora recorrente, requer a condenação do Estado do Rio Grande do Sul na obrigação de fornecer (fazer) o medicamento Lumigan, 0,03%, de uso contínuo, para o tratamento de glaucoma primário de ângulo aberto (C.I.D. H 40.1). Logo, é mister acolher a pretensão recursal, a fim de restabelecer a multa imposta pelo Juízo de primeiro grau (fls. 51-53).

7. Recurso especial conhecido e provido, para declarar a possibilidade de imposição de multa diária à Fazenda Pública.

Acórdão submetido à sistemática do § 7º do artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973 e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n.

08/2008.” ( REsp XXXXX/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/04/2017, DJe 22/06/2017).

Não obstante, tendo em vista o necessário resguardo dos recursos públicos e visando ao cumprimento da obrigação com o menor gravame possível, estabeleço condicionantes à manutenção deste fornecimento medicamentoso à parte autora, quais sejam:

a) Que comprove a persistência do tratamento, mediante a apresentação da receita médica atualizada em periodicidade não inferior a seis meses, junto à Unidade de Saúde competente de seu Município;

b) Que, em caso de suspensão ou interrupção do tratamento, seja a Unidade de Saúde competente comunicada no prazo máximo de cinco dias;

c) Que, em caso de suspensão, interrupção ou mesmo diante de inadequação ou ineficácia do tratamento com o medicamento ora deferido, sejam devolvidos os frascos excedentes no prazo máximo de cinco dias na Unidade de Saúde competente; e

d) Que mantenha atualizado junto à Unidade de Saúde competente os dados da parte autora, especialmente de contato telefônico e endereço residencial e eletrônico.

Ressalvo que o desatendimento de qualquer das referidas condicionantes poderá importar na revogação da tutela de urgência ora deferida.

Anoto, ainda, que as eventuais comunicações junto à Unidade de Saúde do Município, estabelecidas nas condicionantes, não influem nem afastam a solidariedade da obrigação por todos os corréus na condenação ora decretada, mas servem, tão somente, como facilitadoras da ciência de ocasionais alterações, junto ao ente federativo que está mais próximo do cidadão, devendo aquele (o Município) cientificar os demais, se o caso.

Em face do exposto, dou provimento ao recurso, para determinar que os réus, solidariamente, adotem as providências necessárias ao fornecimento mensal e gratuito do medicamento objeto da ação, necessário ao tratamento da saúde da autora, por intermédio do Sistema Único de Saúde, mediante a apresentação da prescrição médica, na quantidade necessária que garanta a eficácia do tratamento, devendo a parte autora informar qualquer alteração junto à Unidade de Saúde competente, nos termos das condicionantes lançadas na fundamentação.

Defiro a antecipação dos efeitos da tutela que deverá ser cumprida no prazo de 30 (dias), sob pena de pagamento de multa diária que fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia de atraso no seu cumprimento.

Oficie-se, com urgência para cumprimento.

Sem custas e honorários advocatícios.

É o voto.

III – ACÓRDÃO

Decide a Terceira Turma Recursal do Juizado Especial Federal Cível da Terceira Região – Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto da Juíza Federal Relatora. Participaram do julgamento o (a) s Excelentíssimo (a) s Senhore (a) s Juízes Federais: Dra. Nilce Cristina Petris de Paiva, Dr. David Rocha Lima de Magalhães e Silva e Dr. Leandro Gonsalves Ferreira.

São Paulo, 04 de dezembro de 2019.

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