4 de Julho de 2022
- 2º Grau
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Tribunal Regional Federal da 3ª Região TRF-3 - APELAÇÃO CRIMINAL: ACR 000XXXX-89.2010.4.03.6110 SP - Inteiro Teor
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Publicação
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Inteiro Teor
PROC. -:- 2010.61.10.008668-3 ACR 68056
D.J. -:- 23/06/2017
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0008668-89.2010.4.03.6110/SP
2010.61.10.008668-3/SP
APELANTE : SALETE DA SILVA ZILLI
ADVOGADO : PR044434 CARLOS ROBERTO ALBERTON e outro (a)
APELADO (A) : Justiça Pública
No. ORIG. : 00086688920104036110 3 Vr SOROCABA/SP
DECISÃO
Cuida-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público Federal, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra acórdão proferido por esta Corte que deu provimento ao recurso de apelação da ré para absolvê-la, em razão da atipicidade da conduta com fundamento no princípio da insignificância.
Alega-se, em síntese:
a) contrariedade e negativa de vigência ao art. 334-A do CP e ao art. 20 da Lei nº 10.522/02, verificando-se justa causa para a persecução penal, notadamente porque ausentes os requisitos para a aplicação do princípio da insignificância;
b) contrariedade e negativa de vigência ao art. 20 da Lei nº 10.522/02, bem assim dissídio jurisprudencial quanto à interpretação do aludido artigo, uma vez que o valor dos tributos iludidos superou o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Em contrarrazões, o recorrido sustenta o não conhecimento do recurso ou seu desprovimento.
É o relatório.
Decido.
Atendidos os pressupostos genéricos recursais.
A ementa do acórdão recorrido está redigida nos seguintes termos:
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. DESCAMINHO. ART. 334, § 1º, ALÍNEA D, E § 2º, DO CÓDIGO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. PRELIMINAR REJEITADA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR DOS IMPOSTOS FEDERAIS ILUDIDOS INFERIOR A VINTE MIL REAIS. APELAÇÃO PROVIDA. ABSOLVIÇÃO.
1. Diante do atual entendimento compartilhado pelas duas turmas integrantes do Supremo Tribunal Federal, é aplicado o princípio da insignificância ao delito de descaminho quando o valor dos tributos iludidos não exceder R$ 20.000,00 (vinte mil reais), nos termos das Portarias 75 e 130 do Ministério da Fazenda, que, na prática, acabaram por alterar a previsão contida no art. 20 da Lei nº. 10.522/02.
2. O valor dos tributos iludidos no presente caso é inferior ao atual patamar estatuído para aplicação do princípio da insignificância (R$ 20.000,00 - vinte mil reais).
3. Exclusão do PIS, COFINS e ICMS para reconhecimento do princípio da insignificância.
4. De rigor o reconhecimento da atipicidade do fato com fundamento no princípio da insignificância, máxime quando, na hipótese, não há cogitar-se de que a recorrente seja contumaz nesse tipo de crime.
5. Apelo provido. Sentença reformada para absolver a ré.
O recurso merece ser admitido no que tange ao argumento de inadequação do parâmetro utilizado para afastar a relevância penal da conduta no delito em questão, eis que a maciça jurisprudência torna irrelevante a conduta quando o débito não ultrapassa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Destoa, assim, do entendimento jurisprudencial firmado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (grifei):
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PRETENDIDA APLICAÇÃO. POSSIBILIDADE. VALOR DOS TRIBUTOS ILUDIDOS INFERIORES A R$10 MIL. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO.
1. Embora tenha entendimento pessoal de que soa imponderável, contrária à razão e avessa ao senso comum tese jurídica que, apoiada em mera opção de política administrativo-fiscal, movida por interesses estatais conectados à conveniência, à economicidade e à eficiência administrativas, acaba por subordinar o exercício da jurisdição penal à iniciativa da autoridade fazendária, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.112.748/TO, rendeu-se ao entendimento firmado no Supremo Tribunal Federal de que incide o princípio da insignificância no crime de descaminho quando o valor do tributo iludido não ultrapassar o montante de R$ 10.000,00, de acordo com o disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002. Ressalva pessoal do relator.
2. O esforço interpretativo, a meu ver, a par de materializar, entre os jurisdicionados, tratamento penal desigual e desproporcional, se considerada a jurisprudência usualmente aplicável aos autores de crimes contra o patrimônio, consubstancia, na prática, sistemática impunidade de autores de crimes graves, decorrentes de burla ao pagamento de tributos devidos em virtude de importação clandestina de mercadorias, amiúde associada a outras ilicitudes graves (como corrupção, ativa e passiva, e prevaricação) e que importam em considerável prejuízo ao erário e, indiretamente, à coletividade.
3. Sem embargo, após a edição da Lei n. 11.457/2007, os débitos decorrentes de contribuições previdenciárias serão considerados como dívida ativa da União, atribuindo-se-lhes tratamento semelhante ao dos créditos tributários, apesar de o objeto jurídico tutelado, em crimes como o tipo penal previsto no art. 334-A, do Código Penal - a nominada sonegação de contribuição previdenciária -, ser a seguridade social, patrimônio de todos que compõem o sistema previdenciário nacional, com reflexos nos direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
4. Dessa forma, como o valor apurado a título de contribuições previdenciárias iludidas pelo agravante (R$ 2.093,05) fica aquém do mínimo previsto na Lei n. 10.522/2002, com a redação dada pela Lei n. 11.033/2004, vigente à época da prática delitiva, é de ser mantida a incidência do princípio da insignificância, reconhecida pelo Tribunal a quo.
5. Agravo regimental provido.
(STJ, AGAREsp 1350606/PR, Rel. Ministra ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/03/2016, DJe 28/03/2016)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES. LEI N. 10.522/02. VALOR ELIDIDO SUPERIOR A R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS). PORTARIA N. 75/2012, DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. DESCABIMENTO.
I - A 3ª Seção deste Superior Tribunal de Justiça, apreciando a questão da aplicação do princípio da insignificância ao crime de descaminho, no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.112.748/TO, sedimentou o entendimento segundo o qual somente é cabível o reconhecimento do delito de bagatela aos débitos tributários que não ultrapassem o teto de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em conformidade com o art. 20 da Lei n. 10.522/2002.
II - A Portaria n. 75, de 22 de março de 2012, do Ministério da Fazenda, não conduz à conclusão diversa. Se a execução fiscal pode prosseguir por valor inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), consoante a disciplina legal, então tal montante não pode ser considerado insignificante.
III - In casu, o valor do tributo elidido é superior ao patamar fixado por esta Corte Superior.
IV - Agravo Regimental improvido.
(STJ, AgRg no REsp 1393454/PR, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, QUINTA TURMA, julgado em 08/05/2014, DJe 14/05/2014)
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DÉBITO TRIBUTÁRIO SUPERIOR A DEZ MIL REAIS. PORTARIA MF N. 75/2012. INAPLICABILIDADE.
1. A tese de ampliação, por meio da Portaria MF n. 75/2012, do limite para incidência do princípio da insignificância no crime de descaminho não foi acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme precedentes oriundos de ambas as Turmas que têm competência para a análise do tema.
2. No caso, o Tribunal de origem manteve a absolvição sumária do recorrido, por entender que o parâmetro a ser considerado, para efeito de aplicação do mencionado princípio, seria aquele trazido por meio da referida portaria, o que, portanto, contraria a jurisprudência firmada nesta Corte Superior.
3. Agravo regimental improvido.
(STJ, AgRg no REsp 1342520/PR, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 18/03/2014, DJe 07/04/2014)
Ante o exposto, admito o recurso especial.
Intimem-se.
São Paulo, 07 de junho de 2017.
MAIRAN MAIA
Vice-Presidente